Aos Políticos (Com um Pouco de Carinho e um Tanto de Nojo)
O Amor, esse ser intocável dos nossos tratados, esse mote constante de muitas canções, essa palavra poderosa que a tantos já fez sorrir e chorar, curar... Amor, esse som bom de ouvir pronunciado mesmo que pela voz habituada, constante, banal... Amor! Amor! Romântico ou não, que seja cru, mas sempre sincero, afetando nossos canais sensíveis, irrigando nossas vinhas, invisivelmente a se espalhar pela atmosfera no sorriso iluminado dos apaixonados, no gesto bom, na companhia decente, no acasalamento febril das espécies, na troca mútua dos que evoluem em cada passo, pois sabem que pra frente é que se anda, e nunca pra trás mais. A vida é um fio só.
Ah, esse amor que acende a luz dentro das pessoas, clareando suas rotas, interligando-se através dos sinais elétricos, essa química boa relaxando as tensões, vibrando pulsante numa esperança contínua, aquecendo nossa carne viva, visitando os íntimos nas horas de suas grandezas espasmódicas, tesão dos tecidos a explodir nos músculos fálicos, frenesi do corpo, desejo humano, do bem.
Esse amor que sonhamos impregnando o ar das tubulações conexas, cortejando as autoridades nos gabinetes, alentando os prisioneiros em seus túneis, aquecendo a sociedades, a mercados, aos anúncios, os canhões, penetrando a ferrugem das armas de guerra, contornando bloqueios, expandindo fronteiras, impondo-se, leve sobre os dias livres.
Quão belo! Cintilante arcoíris esse amor a se traduzir na estrada auroral, no reflexo do sol a nascer sob as águas do mar ancestral, na maravilha natural, no pequeno espetáculo grande, no fluido corrente a consumir o todo e a si próprio, nas dádivas diárias, em cada conquista, no suor dos nossos irmãos, no olhar das mães para os filhos, no sorriso dócil das crianças inocentes, na ingenuidade despretensiosa das colaborações feitas sem segundas intenções, na rotina doméstica, tão trivial.
Sim, esse amor agora, o de antes também - ambos iguais - , movente, pronto a nos acudir em qualquer hora, nas circunstâncias mais adversas e menos prováveis, nos impelindo a fugir dos limites, do beijo crônico da morte, da arena tóxica, dos vírus globais do terror, dos golpes do traidor, de tudo enfim; esse amor que gera a força para superar a dor, a vergonha, a inércia, a dúvida, e que ainda é capaz de atiçar em nós o sentimento de bravura, orgulho, resistência, tudo que for necessário para conseguirmos aplacar o desespero, a ira e o desprezo pelos que se propuseram a representar nossas vontades, envenenando nossa fibra e apertando em nosso pescoço o laço de suas mentiras, como farrapos morais que já não sabem mais o que é viver em paz, com suas consciências vendidas.
Certo é que ele é bom. Mas não é cego.