quando eu vi, menino, pela primeira vez em minha várzea na caatinga, chegarem os homens do conjunto, com seus instrumentos musicais, para mais à noite fazerem o baile, a alegria das pessoas, os tocadores descontraídos, as cores marcantes das teclas de marfim do órgão elétrico, o translúcido tecido da bateria, onde posei orgulhosamente para uma foto pros meus pais, a magia do som, sua incorporação pelo meu ser, a intensa vibração de minha alma moleque, variações da pressão do ar, rufos e melodias conjugadas para aquela explosão de euforia de público e palco... nossa! quanta felicidade... tanta, que depois, algum tempo mais tarde me fascinaram as notas, os acordes, as dissonâncias, os timbres, solfejos, orquestrações de toda matiz, ritmo & luz, breques, harmonias, os duetos, trios e quartetos, polcas, marchas, baiões, valsas, boleros, sambas, bossas, troças, charangas, folguedos, liturgias xamã, cantos gregorianos, óperas-roq, frevos, choros, serenatas, concertos, coros, recitais, saraus, rêives, bailados, xaxados, pagodes, rumbas, congas, zabumba, trianglo e sanfona, melê, pandeiro, violas, violões, violinos, rabecas, rebecas, rita lee, maysa, a linda joyce, o joy, o cure, o fall, o doors, o velvet, o pink, o punk, a new wave, o blues, a gaita, a guitarra distorta, a psicodelia, jimmy e janis, carpenters, solos e bandas, shows e ensaios, fumo e pó, talagadas de cachaça, seringas e sangue, sexo, sujeira sonora, cigarros de todos os vícios, chico buarque, chico césar, chico antônio, chico elion, chico alves, chico de cezário, chiques e decadentes, personagens da biografia real, rural, urbano, misto, curau, xisburguer, salada completa, farofa carioca, feijoada mineira, a carne do sol, a pele de pelé, ali entre as coxas das moças, suas bocas frescas, seus colos em decote, os olhos lustrosos das meninas felizes, os sorrisos de todos os mortais, bem menos aterrorizantes que suas caretas, por mais amarelos que sejam, a instigante beleza feminina, a lourice dos seus cabelos, os apelos da morenice, sussurros sensuais das fatais, cantadas carentes, o fogo, o ópio, o gás, trás e frente, rua e largo, praça e giro, garça e pombo, grilo e fante L, raio X, corredor F, sala 2, setor 3, GO, RN, RS, RO, PA, monitor, cabos e extensões em perfeitas condições, estantes para pratos e prateleiras para livros, trapos velhos, discos ainda de vinil, fitas-cassete, fitas de nosso senhor do bonfim, baías e enseadas, praias, praias tropicais, praias tropicais do brasil, a garota de búzios, o garoto de camboriú, os mares, os céus, os oceanos, os ares, os pares, os singulares, os amantes, os débeis, os frívolos, os idiotas, os maquiavélicos, os cruéis, os fiéis, os bonés, os cintos, os broches cravejados de pérolas caras, os pratos vazios dos famintos, o impacto do choque destroçando a frágil cartilagem, a solidão dos guetos, o medo dos habitantes da metrópole, a selva de concreto, os esgotos entupidos, água, a mata, o mato, a terra... os países... os continentes... o planeta... ... os cometas... o universo...

é tudo uma coisa só.